Rafael Fraga - músico e empreendedor cultural
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O peido verbal do senhor deputado

9/19/2012

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É fácil perder uma perspectiva geral do muito que vai acontecendo fora do exíguo universo onde nos movimentamos. E, cada vez mais, com a nossa atenção dispersa por objectos e tecnologias que nos fascinam, especialmente desenhados para nos cativar num ápice, lá nos enredamos em malhas cibernéticas sem dispor das ferramentas que nos permitem triar e equilibrar o nosso enfoque.

Pessoalmente, embrenhado neste projecto pessoal de vivência e sobrevivência em torno da música, optei em tempos por um certo afastamento e, numa opção perfeitamente consciente mas não isenta de algum desconforto, teimei em manter-me tão distante e desatento quanto possível - sobretudo, no tocante às pequenas evoluções diárias das corriqueiras politiquices.

Todavia, o grave momento que atravessamos impõe um peso esmagador na consciência dos intérpretes deste teatro - há que resistir à tentação de assumir falhanço individual de proporções globais, porque assim nos querem fazer crer, e, ao mesmo tempo, encontrar soluções para gerir a nossa motivação no arrastar desta carroça de pedra maciça em que se torna a angariação do básico. 

Ultimamente, porque o tal peso esmagador me vem vergando a pouco e pouco, e porque as redes sociais, que uso (não só) como ferramenta de trabalho, nos inundam os sentidos, tenho vindo a acompanhar de perto e em directo as convulsões, os escândalos, os desastres históricos, não apenas do nosso Portugalinho, como dos seus primos e pares, USA e EU. E porque a estupidez e exploração grassam de forma demasiado atroz, instala-se a revolta, e até o nosso exíguo universo deixamos afogar nestas mágoas mediáticas, nestes romances de cordel que envolvem ministros, presidentes, juízes, deputados e suas mafias pessoais, magnatas e "corporate CEO's" e toda essa corja do poder, que mata sem ver a quem.

Há um apego generalizado e quase visceral a noções comezinhas que sempre me irritaram profundamente: que a vida não é fácil, mas que as dificuldades fortalecem, e que só as contrariedades fermentam o amadurecimento. Mas será preciso tanto? Temos todos que pautar pelo modelo de escravidão física e mental que norteia as sociedades de consumo desenfreado? E ar para respirar, não? Será possível queimar a pele ao sol e encher o bucho sem naufragar em sentimentos de culpa? Eu gostava.

Mas gostava também de passar os olhos no ecrã, e, apesar da crise, ver que o irmão-cidadão  gosta mais de história, cultura, livros, questões pertinentes do passado, ciência, filosofia - conhecimento, enfim, do que a mediocridade perene da informação circunstancial. E que infinitas listas de comentários maniqueístas sobre o último peido verbal que deu o candidato x ou y ou as divagações ignorantes do impacto da subida dum qualquer parâmetro financeiro  - sobre o que nem o próprio Adam Smith arriscaria um gracejo -, ocupassem uma percentagem razoável, mas equilibradamente reduzida, das paixões.

Tanto olhamos para o problema que nos deixamos cegar por ele. Salvemo-nos por favor deste tédio - e, se não mergulhar, pelo menos molhar os pés em Fascínio, Beleza, Mistério e Paixão. É que a cegueira mental é afinal parceira da tal vida dura: parece que nos amadurece, pois parece. Mas só nos torna seres piores e mais infelizes.
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